Jovens artesões de Molelos transformam tradição do barro negro em arte
Molelos é terra de oleiros. A tradição do artesanato em barro negro está viva e de boa saúde e a adaptar-se aos novos tempos, com artesãos a assumirem-se, cada vez mais, como artistas. Aos artífices antigos têm-se juntado, ao longo dos últimos 20 anos, jovens oleiros que mantiveram vivos os costumes da terra, recriando a arte que tornou célebre este povoado do concelho de Tondela.
São sete os oleiros que, neste momento, se dedicam a tempo inteiro ao ofício. Entre aqueles que reproduzem o saber tradicional e os que procuram inovar, há um casal que se diferencia: Alexandra Monteiro e Carlos Lima partilham, há cerca de 20 anos, a existência e o fervor pela arte do barro negro.
O lema é criar. Fazer novo. Fazer diferente.Carlos Lima tem 42 anos. É de Tondela. Andou pela ACERT nos primórdios da associação. Entusiasmou-se quando frequentou um curso de olaria organizado pela colectividade e, desde então, não mais deixou de amalgamar mãos, barro, roda e ideias.
Passou por olarias onde aprendeu o processo de cozedura do barro numa ligeira cova escavada no solo chamada “soenga” usando lenha e caruma de pinheiro como combustível. Aprendeu como no final da cozedura se acrescentam ramos verdes ao forno tapando em seguida os orifícios de saída, provocando assim uma atmosfera carregada de carbono que se deposita sobre as peças e uma transformação físico-química dos óxidos metálicos das argilas devido ao monóxido de carbono. Aprendeu a brunir. A usar seixos do rio. Mas não era suficiente. Quis saber mais. Foi para Itália, onde frequentou um curso de cerâmica. Voltou para Molelos com ideias novas e na companhia da lisboeta Alexandra Monteiro que partilhava com ele o gosto pela olaria.
Não têm conta os cursos que já frequentaram depois, de modo a aperfeiçoar técnicas. Não há dedos que contem as descobertas que têm feito juntos: a das peças que saem da roda para depois serem transformadas por mãos hábeis e criativas, a de estender o barro como se fosse massa, a das colagens, a da utilização do pó de talco no polimento da textura das peças. “Antigamente”, conta Alexandra Monteiro, “99 por cento das peças saíam directamente da roda e, agora, já fazem medalhas e fruteiras.
Muitas peças eram deitadas foram porque rachavam na cozedura e, connosco, os outros oleiros aprenderam que, usando vinagre, as rachas podem ser tapadas”. “No entanto”, diz Alexandra Monteiro, “há descobertas que se fazem de forma solitária. Os materiais que vamos experimentando, as formas criadas ao passo da roda, as texturas que inventamos. Temos de ir tacteando até encontrar a forma que, afinal, estava na nossa cabeça.”
Muitos têm sido os prémios conquistados pelo casal de oleiros. A recompensa tem chegado através de convites para participarem em feiras nacionais e internacionais. A mais recente levou-os a Barcelona. “Pela primeira vez”, anuncia Carlos Lima, “artesãos portugueses foram convidados a expor os seus trabalhos na Catalunha”.
Sandra Bernardo in
Jornal do centroed. 302, 28 de Dezembro de 2007